sábado, julho 31, 2004

Portugal podia ser um país muito melhor, é uma pena estar tão cheio de ... portugueses

Não é que eu seja um grande patriota, mas a verdade é que até fico satisfeito por ver portugueses terem sucesso, e verem o seu trabalho reconhecido pelo Mundo fora. Convenhamos que é mais agradável, ser-se conterrâneo do José Saramago, e do José Azevedo, do que do Bibi, do Farfalha, do Jorge Sampaio, do Santana Lopes, ou daquele indivíduo, coitado, que num país fértil em incêndios, compra submarinos. Tá mal, mas adiante ...
A referência ao José Azevedo, não é totalmente inocente. Confesso. Fico, repito, satisfeito por haver ser um português a desafiar as teorias de Einstein, mas a minha faceta mais popularucha, vibra mais com êxitos desportivos. E no desporto, se há competição por que tenho um interesse especial, é a Fórmula 1. Ora, esta é uma modalidade onde os portugueses não têm uma grande tradição, o que não deixa de ser estranho, dado o grande número de “Schumachers” que todos os dias curvam e contra-curvam nas nossas estradas. E porque será? Será, suponho eu, por Portugal ser um país com poucas possibilidades de apoiar e de competir, em termos de patrocínios com outras nações. Sim, não pode haver outra explicação. Não acredito que seja por falta de talento: um piloto português pode ser tão ou mais veloz que qualquer Schumacher – o Schumacher arranca com o sinal verde, os portugueses arrancam com o vermelho; o Schumacher não abranda nas curvas, os portugueses não abrandam nas passadeiras; o Schumacher faz ultrapassagens pela esquerda e pela direita, os portugueses também, para além de as fazerem por cima de passeios, e em sentido contrário onde mais ninguém o faria; para além disso os carros de F1 não têm ‘piscas’! O que é óptimo, porque os portugueses também não os usam! A lista de virtudes não tem fim ... Mas então porque não triunfam os portugueses? Bom, deitei-me a adivinhar e as conclusões a que cheguei, demonstram que certas tradições lusas, prejudicariam e muito o desempenho dos pilotos portugueses: o Schumacher festeja, depois de sair do carro, com champagne, os portugueses festejam com vinho e cerveja, antes de entrarem no carro – tá mal; o Schumacher segura com firmeza o volante, com as duas mãos, os portugueses conduzem com um mão e vão com a outra de fora – tá mal; o Schumacher quando se depara com um acidente segue o seu caminho, os portugueses abrandam e fazem orçamentos – tá mal; a isto junta-se o facto de num F1, não haver retrovisor para pendurar o terço e o CD, entre outros acessórios. E depois há sempre aquela questão da F1, ser “a disciplina máxima do desporto automóvel”, e toda gente sabe que seria mais fácil ouvir um cavaquinho numa música do Marylin Manson, que encontrar um português disciplinado. Bom, paciência. Temos sempre o futebol ...

sexta-feira, julho 30, 2004

Chegue-se pra lá!

Acreditando que há um grau óptimo de distância (física) entre as pessoas, foram surgindo algumas teorias. A minha favorita divide a distância pessoal em quatro tipos: a íntima (cerca de 50cm), a pessoal (até 150cm), a social (varia entre os 120 e os 360cm) e a pública (para além dos 3,5m!). Ora o que tá mal nisto tudo é que poucos respeitam a primeira, tornando-a a única distância entre indivíduos que não se conhecem. Como diz Margarida Marques no artigo "Saber guardar distâncias": a distância íntima "é uma verdadeira zona interdita, onde o nosso odor e a nossa temperatura estabelecem os limites: nessa zona "perigosa" deixamos entrar os seres dos nossos afectos e defendemo-nos das ofensivas por uma rigidez muscular e um olhar vago e longínquo".
Quando o espaço pessoal é invadido por estranhos, ocorre um esforço para restabelecer esse espaço ou para afastar o intruso. "Fisher e Byrne (1975) verificaram que os indivíduos do sexo masculino respondem de modo mais negativo do que as mulheres à invasão do espaço pessoal a partir da frente, ao passo que as mulheres respondem mais negativamente às invasões do espaço pessoal que venham dos lados" (Goldstein, 1983).
Isto é interessante, porque eu devo situar-me no meio. E onde deveria estar a virtude, está o roço.
Na paragem quase deserta do autocarro, aproxima-se uma mulher que se postra exactamente a 5cm de mim. Ora eu não sou desconfiada, mas isto torna-me desconfortável. Dou um passo ao lado e ela segue-me prontamente, levantando as sacas do chão e recolocando-as quase em cima dos meus pés. TÁ MAL! A vontade de dizer "chegue-se pra lá!" é abafada pela vergonha e lá fico eu a aguentar o bafo de carne assada.
Entra um indivíduo no autocarro. Corre com o olhar os assentos vagos e decide sentar-se ao meu lado. Não é gordo mas tende a abrir demasiado as pernas. TÁ MAL! Porque eu tenho de me colocar numa posição incômoda e seguir viagem num esforço constante para não me roçar nele.  A vontade de dizer "chegue-se pra lá!" é abafada pela vergonha e lá vou eu apertadinha contra a janela, a torcer para que o fulano se digne a reparar no meu desagrado ou a sair na próxima paragem.
Imediatamente atrás de mim, numa fila interminável para pagar a factura da luz, encontra-se um homem a cheirar a cavalo. TÁ MAL! Mais uma vez, a vontade de dizer "chegue-se pra lá!" é abafada pela vergonha e a sensação de náusea continua.
As pessoas têm esta tendência para invadir o espaço pessoal do próximo como que a conquistar um novo território. São intrusos e praticantes devotos do roço. Benditos animais que podem delimitar o seu espaço com urina!
É aqui que estabeleço uma comparação entre os portugueses e os árabes. Se não, leiam: "Para os árabes não existe isso que denominamos intrusão em público. Público significa público. Compreendendo-se esse facto, grande parte do comportamento dos árabes que chega a causar uma sensação de estranheza, desagrado e, por vezes, até mesmo de medo passa a ser entendida. Por exemplo, verifiquei que, se A está na esquina de uma rua e B quer o lugar de A, B está no seu direito se faz o que pode para molestar A de tal maneira que este saia do local. Em Beirute, só os mais arrojados se sentam na última fila de um cinema, porque geralmente há pessoas de pé que se querem sentar, que empurram, que dão cotoveladas e causam tal perturbação que a maioria das pessoas sentadas na última fila desiste e sai..." diz Hall.
E então fez-se luz! A mulher na paragem queria entrar em primeiro lugar no autocarro; o homem no autocarro queria, na verdade, sentar-se no meu lugar, perto da janela; e o homem na fila queria diminuir o seu tempo de espera, fazendo com que eu desistisse e voltasse numa outra altura!

quinta-feira, julho 29, 2004

Cuspa aqui

Ao passar pela rua do breyner, ou uma dessas transversais labírinticas da zona de cedofeita, deparei-me com um estranho graffiti no chão. Tinha um alvo perfeitamente desenhado a stencil e dizia: cuspa aqui. Aquilo divertiu-me, fora o vandalismo da coisa, pois esta é uma das verdades tá mal do nosso amado Portugal.
Não há rua, passeio, esquina ou degrau que não ostente uma dessas peripécias salivares - há que admitir que algumas são verdadeiras obras primas -, mais vulgarmente conhecidas como bisgas, dos nossos conterrâneos praticantes do cuspa aqui que se esquecem do lenço em casa ou, pior ainda, no bolso.
É vê-los a puxar num esforço ruidoso pela porcaria que vêm lá desde o dedo mindinho para a cuspir orgulhosamente no chão. Depois sacam do lenço e limpam a boca: ah, afinal o malandrinho estava aqui, oh diabo...
Já estive, por diversas vezes, para apanhar com uma dessas em cima. Por isso até agradeço o dito "esforço ruidoso", sinal de lá vem bisga. Comparo a sensação pós-bisga à que sentimos quando as pombas levantam vôo e nos cagam na cabeça. A comparação é fraca, sendo que a primeira é de longe pior que a segunda.
Falta de civismo? De higiene? Ou orgulho da condição de macho/fêmea? Não faço ideia. Mas tenciono perguntar, um dia, a um praticante do cuspa aqui e, porque não, ali. Depois conto-vos, 'tá combinado?


Tá mal, mal, mal.

Que o país está mal, toda a gente sabe. O único intervalo do tá mal deu-se no passado mês com o Euro 2004. Um intervalo que apenas camuflou o tá mal. O patriotismo da bola é uma coisa bonita de se ver: as bandeirinhas verde e encarnadas nas janelas são o meu reflexo favorito desta euforia. É caso para dizer que Portugal viu-se grego ao chegar à final. E perdemos. Ai coitadinhos de nós, ai tudo isto é triste tudo isto é fado, ai ai ai.
Mas o que tá mal concretamente? Onde está a gênese do tá mal neste país? É isto que pretendemos discutir - com quem tenha pachorra para isso - neste maldito blog, criado em cima do joelho num laivo de maledicência pura. Mas a maledicência também pode e sabe ser construtiva. Cada post será um TIJOLO apontado à cabeça de a quem sirva a carapuça.